Campo do Medo (filme e conto)

Campo do medo é um filme que estreou na Netflix em outubro de 2019, baseado em um conto escrito por Stephen King e seu filho, Joe Hill, que felizmente seguiu a carreira do pai. Dirigido por Vicenzo Natali (Cubo), mas que hoje em dia é mais conhecido por dirigir séries como Westworld, Deuses Americanos e Hannibal, só para citar algumas. Mesmo com essa carteirada e também tendo Patrick Wilson (Sobrenatural) no elenco, ator que eu adoro tudo o que faz, o longa acabou não sendo tão satisfatório para mim quanto eu desejava.

Sinopse: “Dois irmãos são surpreendidos após escutarem pedidos de socorro vindos do interior de um matagal no Kansas. Eles decidem atender os chamados de ajuda e entram no local. No entanto, logo descobrem que uma vez lá dentro é impossível sair.”

 Aceitei o filme, mas não entendi muito bem sua lógica de acontecimentos. Após acabar, fiquei trabalhando minha mente para tentar entender toda a sua cadeia de eventos que não fez nenhum sentido até agora. Provavelmente, alguém vai aparecer com uma explicação tirada da mente dos próprios autores, ainda assim parecerá louco demais para a minha pacífica mente.

Uma história bem lovecraftiana(*) é encontrada aqui. Uma pedra gigante que não explica para que serve ou como funciona, seres tribais vestidos de mato e um pouco daquela sensação de perturbação são vistas aqui. Esse para mim não é o problema. O que me incomodou foi não ter explicado as coisas. Alguns vão dizer que não precisava, mas nesse caso, precisava, pois nada é explicado, apenas tacado. Só tive o trabalho de aceitar e deixar do jeito que fizeram.

Escrevo esse texto e me pergunto se devo recomendá-lo ou não. Se algo que escrevi te animou, creio que deve vê-lo, se não curtiu nada, passe longe. Seu tempo e sua mente agradecerão. Sei que existem muitos fãs de Stephen King e Joe Hill por aí, mas sabemos que nem tudo o que eles fazem é genial. Tem coisas bem ruins nesse caminho, infelizmente acho que acabei vendo uma de suas obras que não são recomendáveis. Tenho fé de que o conto seja bem melhor do que esse longa.

A título de curiosidade, a atriz Laysla de Oliveira, que faz a Becky, nossa protagonista, é canadense com ascendência brasileira. Ao ver seu nome bem característico, fui pesquisar e achei essa informação.

*O horror Lovecraftiano é um subgênero da ficção de terror que enfatiza o horror cósmico do desconhecido mais do que gore ou outros elementos de choque. É nomeado por causa do autor americano, H. P. Lovecraft, que criou muitas histórias sobre esse tema.


Resenha do conto “Campo do Medo” por Leane Verli:

Stephen King e Joe Hill uniram suas ideias macabras para criarem “Campo do Medo”, que se encontra no livro Carrossel Sombrio escrito por Joe Hill. O conto se passa inteiro dentro de um campo com a vegetação beirando os dois metros de altura e sem saber onde termina. O sentimento de desorientação é presente desde o primeiro momento em que os personagens principais, Becky e Cal Demuth, entram no campo e permanece até o fim. De cara já digo que essa façanha é muito bem escrita, você sente como se estivesse perdido dentro do matagal junto com os personagens. Tentarei não dar spoiler, pois não acontece muita coisa durante a história, logo, cada detalhe é importante.

Assim que o conto começa, a primeira coisa que penso é: quem mandou ajudar? Seria mais fácil se cada um tomasse conta da sua vida e “ema ema ema, cada um com seus problemas”. Você pararia seu carro e desceria para ajudar alguém sem ter a mínima noção do que está acontecendo simplesmente por ter escutado um pedido de socorro? Entenda: você não consegue ver nada além de um matagal imenso, sendo capaz apenas de se guiar pelo que ouve. Vejo um dilema claro na questão, acho que, assim como os personagens, eu também teria feito algo. Porém, nenhuma boa ação fica sem punição. E o conto é a prova viva disso.

Num primeiro momento, acompanhamos os irmãos na tentativa de achar a voz que grita por socorro e quanto mais eles tentam se achar, mais eles se perdem. Como disse inicialmente, a desorientação e a perda da noção de espaço/tempo trazem uma tensão muito grande. Nessa primeira parte vejo presente um terror mais primitivo; um desespero mais humano de não saber onde estar, de sentir sede, fome. E que, ao se sentir extremamente perdido, faz com que o problema que os atraiu até ali seja diminuído. Visto que, agora quem precisa de ajuda urgente são os que entraram pra ajudar.

Num segundo momento do conto a desorientação fica em segundo plano. Outros elementos do terror entram em cena: o contato com o desconhecido – o que seria aquela pedra gigante no meio do campo? Ela que é o grande centro de toda a questão e que não tem uma linha se quer de explicação. Sabemos apenas que há algo místico e super-poderoso na sua essência que faz e traz toda a atmosfera de que o campo está vivo e que, a meu ver, precisa das pessoas para se alimentar. Além do desconhecido, temos a sensação de perseguição. O que seria de um conto de terror sem achar que tem alguém atrás de você? E claro, o grotesco: corpos e sangue. Uma sequência de fatos no clímax do conto revirou meu estômago e imaginar aquilo foi, no mínimo, nojento.

Pela falta de explicação do que verdadeiramente acontece dentro daquele campo e o que o faz ser da forma que é, o final não poderia ter sido outro. Ele acaba com um gancho perfeito para outra história, mas o suficiente pra você entender que não precisa que te digam mais nada, você já sabe o que vai acontecer. Caso você faça questão de coisas minimamente explicadas e daquela última página cheia de revelações, fuja daqui. Caso você seja bom em simplesmente aceitar o que é mostrado e fique satisfeito com suas interpretações, essa criação é feita pra você. Ela tem o ar do King com o grotesco do Hill, pai e filho com suas marcas claras em cada parágrafo.

Além do conto, há uma adaptação que pode ser encontrada no streaming Netflix. Eu já assisti e posso dizer que há elementos que foram criados somente para a telinha. Várias coisas se divergem, o final sendo uma delas. Leia ou assista, e na próxima vez pense se vale a pena ajudar alguém que pede por socorro, ou não.

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