Marighella

Wagner Moura recebeu a biografia de Marighella em 2012 da vereadora Maria Marighella, neta de Carlos Marighella, tema central desse filme. Em busca de um diretor perfeito para o projeto, o próprio ator notou que ele era o mais apto para a função. Quase 8 anos depois, o longa ficou pronto, teve sua estreia em festivais fora do país onde foi muito elogiado e também criticado. No Brasil, a obra foi alvo de ódio, fake news e de alta depreciação de uma parcela da população. Uma censura ideológica foi criada em cima antes de seu lançamento. Motivo do qual ele demorou tanto para estrear por aqui. Isso e a pandemia também. Após 2 anos dele estar pronto, enfim ele estreou em 04 de novembro nos cinemas, data da morte de Carlos Marighella. Nada mais emblemático do que isso.

 

Sinopse: “Comandando um grupo de jovens guerrilheiros, Marighella tenta divulgar sua luta contra a ditadura para o povo brasileiro, mas a censura descredita a revolução. Seu principal opositor é Lúcio, policial que o rotula como inimigo público.”

 

Eu nasci no fim da ditadura no Brasil. Não peguei essa época e tudo o que eu sei sobre ela eu vejo nos livros de história e em relatos de quem a viveu. Não há dúvidas de que foi um período cruel para os amantes da liberdade e por quem lutou pelo fim dos militares no poder. Tenho que dar graças a Deus por termos filmes e livros que nos contam pontos de vista que nunca vimos. Marighella foi alvo de perseguição e de descrédito perante a população. Foi decretado como inimigo nº 1 do Brasil e foi considerado como o terrorista mais perigoso da nação. Pelos olhos de quem governava até poderia ser. É impossível ver tudo o que acontece no longa e não comparar com o nosso momento atual do país. Momentos diferentes, ideologias iguais.

 

Esse filme mexeu bastante comigo porque eu me identifiquei com o protagonista e por sua luta. Uma frase específica do filme soltada pelo personagem vivido pelo Bruno Gagliasso(Loop) bateu forte em mim: “se eu mato preto, mato vermelho”, fazendo uma alusão clara sobre o comunismo. Eu senti, pois esse tipo de discurso ainda é usado até hoje. Não com essas palavras, as coisas são mais veladas, mas estão aí. Essas pessoas continuam por aí, elas só não gostam de ser classificadas como fascistas e racistas mesmo.

 

A princípio o papel principal do longa seria do Mano Brown,vocalista do Racionais MC’s. O rapper saiu do projeto e coube a Seu Jorge(Cidade de Deus) encarnar o protagonista. Achei a escolha ótima, ele é muito bom ator e compro tudo o que ele faz sem o menor esforço. Esse foi o primeiro trabalho de Wagner Moura (Tropa de Elite) na direção e eu achei ótima. A sua câmera é muito bem trabalhada, mostrando o que é de mais importante em cena. Mesmo que o diálogo esteja em outra boca, ele centraliza em quem tem que focar. Tenho que destacar também a cena da tortura que é forte demais e muito bem ensaiada. Aplausos para o ator Jorge Paz(Irmandade) que dá show nesse momento e nos deixa atônitos por alguns momentos.

 

Como toda obra biográfica eu vou atrás de saber o que aconteceu mesmo e o que é ficção. Para deixar a história mais dinâmica e interessante muitas coisas acabam sendo romanceadas para o bem da narrativa. Algumas coisas que ele não fez de verdade acabaram atribuídas a ele e o mote de Marighella com seu filho também foi inventado para dar um drama a mais. Nada disso tira o brilho e só aumenta mais ainda a complexidade de seus momentos finais.

 

Após o filme acabar, temos meio que uma cena pós-crédito mostrando os personagens companheiros de Marighella cantando o hino nacional com muita paixão e ódio. Essa cena por si só consegue resumir todo o sentimento do que é ser brasileiro. Ele se passa nos anos da década de 60, mas poderia ser nos dias de hoje. Essa é uma obra que vai dividir opiniões. Eu gostei demais, mas tenho a certeza de que não vai agradar a todos. Principalmente quem se sentir agredido com ele. Esse é o tipo de filme que poderia escrever uma 10 páginas sobre ele e ainda assim seria pouco devido a sua grande quantidade de camadas.