Tantas Almas

‘Tantas Almas’ é uma produção conjunta da Colômbia, Brasil, Bélgica e França dirigida pelo diretor colombiano Nicolás Rincón Gille (Noche Herida). Esse longa é um enorme registro sobre a crueldade perpetrada pelas tropas paramilitares colombianas durante a guerra civil instaurada no país desde os anos 80. Ele se passa no ano de 2003 e mesmo se passando apenas em um ambiente conseguimos entender tudo o que está ocorrendo. Talvez se tivesse uma explicação a mais sobre o momento contextualizando o público, já começaria vê-lo com outros olhos, pois a princípio não entendemos o porque de tais ações cruéis.

Sinopse: O pescador José atravessa o rio Magdalena, o maior da Colômbia, em busca dos corpos de seus dois filhos, assassinados pelos paramilitares. Apesar de sua dor, José está determinado a encontrá-los, para dar o enterro que merecem e, assim, impedir que permaneçam como almas errantes. Em sua jornada, José revela a magia de um país despedaçado, o que, de diferentes maneiras, evoca o Brasil de hoje.”

Esse é o primeiro longa romanceado do diretor. Antes disso, ele só havia feito documentários e isso fica claro na forma em que ele filma. Muitas imagens contemplativas e com poucos diálogos, mas sempre com uma lente afiada e com a câmera sempre bem posicionada para pegar os melhores takes possíveis. A direção é lenta, mas é do tipo que faz parte da narrativa. O fato de estarmos acompanhando um homem sozinho e com a dor do luto nessa jornada perigosa faz com que essa escolha narrativa soe perfeita.

O longa não é necessariamente baseada em fatos reais, mas sim, em relatos recolhidos aqui e ali. Ao conhecer e entender o momento em que ele se passa, construir toda essa história se tornou praticamente orgânica. O uso de atores amadores locais eleva demais o nível de realidade dele. Todos são realmente reais e nos fazem acreditar rapidamente em todos. Juro que não dá nem para perceber que eles não são profissionais tamanha naturalidade. Um documentarista tem a manha para essa escolha.

A história em si é bem triste e pesada. O título pode remeter a alguma obra sobrenatural, mas não é o caso. O terror aqui é real e o grande vilão é o ser humano. Tememos os mortos, mas devíamos mesmo temer os vivos. Acompanhar essa viagem através do rio se torna muito angustiante no decorrer da projeção. O desejo de dar um descanso para certas almas após a morte é louvável e também muito perigoso de acordo com a situação apresentada aqui. Tememos pela vida do nosso protagonista ao mesmo tempo que sofremos com ele conforme o tempo vai passando.

Em certos momentos ele se torna bem mórbido, mas longe de ser nojento ou aterrorizante. Apenas a situação de desespero que o faz fazer coisas que a nossa mente humana diz que nunca faria. A questão é: talvez se estivéssemos no mesmo lugar, poderíamos sim fazer a mesma coisa. O seu final acaba tendo uma resolução ao mesmo tempo em que fica aberto. Posso dizer que esse é um ótimo trabalho e digno dos maiores festivais do planeta.

‘Tantas Almas’ estreia nos cinemas em 26 de maio.