Além das Palavras

Um filme sobre uma poeta americana no Século 19 que não foi lançado no circuito de cinema dos Estados Unidos. Já captou o clima cult? Eu, que estou acostumada com uma dieta hollywoodiana (quando se trata de audiovisual), achei que teria indigestão. Imagine como fiquei chocada quando vejo Cynthia Nixon, eterna Miranda de “Sex and the City”, como Emily Dickinson (1830 – 1886) em “Além das Palavras” (“A Quiet Passion”).

Escrito e dirigido pelo inglês Terence Davies (“Amor Profundo”, 2011), o filme tem atores britânicos e americanos acompanhando Cynthia no tributo à autora. Jennifer Ehle, que ganhou destaque em 1995 como Elizabeth Bennet na adaptação em minissérie de “Orgulho e Preconceito” da BBC interpreta Lavinia “Vinnie” Dickinson; Keith Carradine (“Dexter”) fica com o papel do pai; o escocês Duncan Duff faz o irmão de Emily e Vinnie; por fim, a inglesa Joanna Bacon é a mãe do trio. O resultado foi aplaudido pela International Cinephile Society e pela Online Film Critics Society, e levou o Grand Prix de Melhor Filme no Festival de Gante (Bélgica).

O ritmo calmo do filme, assim como o figurino impecável, nos transportam de volta ao Século 19, apresentando a vida reclusa das irmãs Dickinson na propriedade da família no norte dos Estados Unidos. Começamos com uma jovem Emily sendo resgatada pela família do seminário feminino onde passou um ano estudando, por ter divergências de pensamento da direção. Ao longo da narrativa, observamos a formação da poeta que cativa leitores até hoje, e como ela era agarrada à família e à própria casa. Também conhecemos personagens chave da vida dela, como o reverendo Charles Wadsworth, homem com quem sentiu mais afinidade.

Versos de Dickinson inseridos em pontos estratégicos do roteiro mostram a importância dos eventos retratados na vida da poeta, assim como as reflexões feitas a partir deles. Emily foi uma mulher séculos à frente de sua época, profundamente incompreendida: num tempo em que mulheres eram incentivadas a ser nada mais que boas cristãs, se recusava a implorar por salvação divina e se considerava dona da própria alma. A personalidade forte da escritora é retratada com maestria por Cynthia Nixon, que consegue dar o tom dramático certo sem cair no piegas. Fãs da poeta e de cinema de qualidade vão sair satisfeitos.